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terça-feira, 5 de maio de 2015

Falta transparência na divulgação dos dados sobre investimento em educação

Blog do Daniel Cara

Daniel Cara

A Folha de S. Paulo divulgou nesse sábado (04) números nacionais sobre o investimento público em educação. Segundo o jornal, com base em dados do Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira), o Brasil investe 6,6% do PIB no setor.
Alguns pontos chamam a atenção. Sem retirar o mérito do veículo em divulgar informações inéditas, deveria ter havido uma coletiva de imprensa oficial sobre o tema. Além de mais democrático e transparente, como deve ser toda divulgação de dados governamentais e de interesse público, isso daria a oportunidade para os jornalistas e estudiosos problematizarem os montantes. Também seria necessária a produção de um estudo que discorresse detalhadamente sobre os valores. Essa era a prática do Inep até 2010.
Na manhã do sábado (04), não encontrei no site do órgão qualquer informação sobre os dados divulgados pela Folha de S. Paulo. Na sessão “Investimento público em educação” as informações mais atualizadas vão até 2011. A falha pode ter sido minha, mas os manuais de transparência são claros: o acesso às informações deve ser fácil.
Outro problema é que a principal matéria publicada na Folha de S. Paulo traz apenas dados relativos ao investimento público total. Ou seja, contabiliza-se o investimento público em educação pública, mas também em parcerias público-privadas. No passado, duas informações eram divulgadas: primeiro, o patamar de investimento público direto (dinheiro público investido em educação pública); depois, o investimento público total.
Pela internet, os dados divulgados no jornal também não trazem a participação de investimento por ente federado; creio que o mesmo ocorra na versão impressa. Os últimos valores veiculados sobre esse tema estão disponíveis apenas no blog do jornalista Fernando Rodrigues, graças a um requerimento de informação impetrado pelo Senador Randolfe (Psol-AP). Na época descobriu-se que o esforço financeiro da União não avançava se comparado ao empenho de Estados e Municípios.
As duas matérias da Folha de S. Paulo também trouxeram o dado de que a média de custo-aluno por ano nas redes públicas brasileiras foi de R$ 6.203 em 2013, o que demonstra avanço – fruto, diga-se de passagem, de muita luta social. Contudo, a falta da devida problematização dos dados sempre leva a erros de interpretação. Trata-se da média. E a média no Brasil é o melhor esconderijo das desigualdades. Além disso, entre pesquisadores e gestores públicos, há dúvidas sobre a validade dos dados, normalmente extraídos do Siope (Sistema de Informações sobre Orçamentos Públicos em Educação). Embora meritório, esse sistema ainda sofre com muitos problemas de preenchimento e validação de dados.
Ademais, a maior parte das redes públicas brasileiras conta essencialmente com os recursos do Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e Valorização dos Profissionais da Educação). E ele representa quase a metade do custo-aluno por ano informado pelo Inep.
Por último, quase todas as fontes ouvidas nas duas matérias publicadas pela Folha de S. Paulo insistem em uma suposta obviedade: “não bastam recursos, é preciso melhorar a gestão”. O Brasil precisa compreender que o financiamento é parte da gestão educacional, não algo apartado dela. A lógica é simples: para pagar os profissionais da educação e manter as escolas com dignidade é preciso ter o recurso necessário. Sob qualquer ótica, há consenso de que os valores praticados no país são insuficientes. O mecanismo do CAQi (Custo Aluno-Qualidade Inicial) comprova isso.
Também é necessário lembrar que, além de obrigação, deve ser compromisso do gestor público otimizar custos, gerir o dinheiro do contribuinte com eficiência e responsabilidade. Mas com os montantes atuais, não é possível melhorar a educação. Por exemplo, hoje os professores recebem, em média, cerca de 70% do que a média salarial das demais profissões com a mesma escolaridade. E como a média, além de esconderijo, é o reino das desigualdades, a realidade de grande parte dos docentes é bem pior.
Coube a Luiz Claudio Costa, secretário executivo do MEC (Ministério da Educação), o exercício da lucidez nas matérias da Folha de S. Paulo. Sobre o aumento de recursos no Ensino Médio, ele afirmou: “Essa é uma resposta de longo prazo. O investimento feito vai ter [repercussão] numa geração mais à frente”. Perfeito. Acrescentaria e insistiria apenas que os valores ainda estão aquém do necessário.
Diante desse quadro, a expectativa é que o Inep estabeleça, novamente, procedimentos republicanos para a divulgação dos dados educacionais. Tanto no âmbito do financiamento da educação como no caso das avaliações de larga escala empreendidas pelo órgão.
Diante do descuido na divulgação dos dados, é bem possível que, a partir de amanhã, editoriais de grandes jornais, matérias em rádios e canais de televisão, além de textos de articulistas critiquem o patamar de investimento em educação. Dirão que o montante praticado hoje já é alto, segundo algum critério arbitrário – erro que não foi cometido pelos jornalistas Flávia Foreque e Gustavo Patú, da Folha de S. Paulo. Em seguida arrematarão: o ajuste fiscal impõe limites à ampliação dos custos no setor. Enfim, é curioso ver como no Brasil há todo um esforço para contrapor o financiamento adequado e justo de uma política social como a educação.

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